segunda-feira, 20 de setembro de 2010

O elogio da Natureza na Pintura de Gil Mário

“... É como se uma presciência lhe desse um sentido exato dos motivos sem a necessidade de desenhá-los. A relação dialética entre os elementos plásticos: as linhas, as cores magistrais, as formas e os brancos na vegetação onde os pássaros se escondem, é atraente, equilibrada, assegurando a qualidade e preservando o encantamento da natureza nas plantas e pássaros do sue belíssimo semi-árido.” (Matilde Matos, Salvador/2000)


Gil Mário por Edivaldo M. Boaventura
Saudação
O professor Gil Mário de Oliveira Menezes entra, nesta Academia, como se fosse o prolongamento natural da casa de seu avô Áureo Filho e de sua mãe a professora Maria Cristina, a nossa querida Marinita.
A destinação para o ensino começou bem antes do seu nascimento. Sim, nascido e criado em uma família de educadores, você aceitou o chamado para o ensino e para as artes.
Em linha direta, são três gerações de educadores que se encontram nesta noite e que se sucedem: Áureo de Oliveira Filho, seu avô, um dos nossos patronos; Marinita, sua progenitora, uma das fundadoras deste sodalício; e, agora, você, Gil Mário, é o recipiendário, aquele que ingressa em um sodalício, esperado e confirmado pela eleição que consagra.
Todos três, avô, filha e neto, estão presentes nesta Companhia.
Todos três são cidadãos prestantes da comunidade feirense e construtores de sua educação.
Vejamos a primeira geração. Com a criação do Colégio Santanópolis, Áureo Filho firmou um marco indelével da educação secundária, formando gerações de jovens e atraindo alunos de toda a Bahia.
A bem dizer, com o Santanópolis de Feira, o Colégio Evangélico do Município de Wagner, o Colégio Taylor Egídio de Jaquaquara, o Ginásio Municipal de Ilhéus e o Clemente Caldas de Nazaré pontuou-se, pioneiramente, de estabelecimentos de ensino médio as interioridades.
O ensino médio concentrava-se até então, em Salvador, sendo que de 1836, com o Liceu Provincial, até 1947, quando começaram os ginásios de bairro , contávamos apenas com um único colégio público secundário na Bahia, o Ginásio da Bahia, além das Escolas Normais.
Como é notório, antes do Santanópolis, o governo Góes Calmon criou a Escola Normal, em 1925, em Feira. Contribuição importante para a formação de professores primários, era prefeito Arnaud Silva.
A propósito examinei uma dissertação de Mestrado em Educação sobre a Escola Normal e as normalistas, do professor Antônio Roberto Seixas da Paixão da Uefs, intitulada Mestras do Sertão (1999)
E bem antes da Escola Normal e do Colégio Santanópolis tivemos as escolas públicas do ensino fundamental e de primeiras letras, no final do século XIX e início do XX, demonstração da política de educação da República. O imponente prédio da antiga Escola Normal, onde hoje funciona o Centro Universitário de Cultura e Arte ( Cuca ), atesta a importância que foi dada à educação primária , como também os edifícios das Escolas Maria Quitéria e João Florêncio Gomes. Construções ligadas às administrações municipais de Agostinho Fróes da Mota e Bernardino Bahia.
Dentre as muitas professoras do início do século XX, destacava-se a exímia Isaura Paiva, que presenteou meu pai com a famosa obra do conde de Afonso Celso , Porque me ufano do meu país , em 26 de novembro de 1915. O título do livro foi responsável pelo tão falado ufanismo brasileiro.
O Ginásio Santanópolis elevou o nível intelectual e quebrou a monotonia educacional da cidade com a presença agitada e irrequieta dos estudantes. A partir de trinta, passou de ginásio a colégio com a última reforma Capanema. Inovou no ensino e estimulou a cultura de diversas maneiras. Lembre-se que a primeira exposição do pintor feirense Raimundo Oliveira foi no Santanópolis, antes da realizada no saguão da Prefeitura Municipal em março de 1951.
As escolas públicas republicanas, a Escola Normal e o Colégio Santanópolis são registros da memória e indicações de pesquisa para a história da educação da Feira. História não tão somente das instituições, mas também das lideranças, cujos nomes patrocinam as cadeiras desta Academia.
Poucos fizeram tanto pela educação, em Feira, como Áureo Filho, estendendo a sua luta pelo ensino onde estivesse, em nossa terra, em Salvador, na Assembléia Legislativa da Bahia, na presidência do Sindicato dos Estabelecimentos de Ensino e, principalmente, na criação da Universidade, iniciativa do governador Luiz Viana Filho, em resposta à inquietação comunitária de base.
Dando continuidade à tradição educacional familiar, no seio da qual nasceu Gil Mário, a elite intelectual da época participou do magistério do Santanópolis. Assim, sublinho o esforço das professoras Edelvira Oliveira, no ensino do Português, e Hermengarda Oliveira, no Desenho e Trabalhos Manuais. Recordemos Dival Pitombo, em História, Gastão Guimarães, em Língua Portuguesa, Pedro Américo, em Francês, Honorato Bonfim e o Joselito Falcão Amorim, em Matemática, um dos nossos titulares. Sucedeu ao professor Áureo Filho, na direção do colégio, o seu filho Evandro Oliveira e a professora Cleoilda Oliveira. O Colégio funcionou de 1933 a 1983, meio século de serviço à educação.

Minhas Senhoras e Meus Senhores
A segunda geração personifica-se na professora Maria Cristina de Oliveira Menezes, licenciada em História Natural, pela Faculdade de Filosofia da Universidade Federal da Bahia, aluna dos professores Jones Seabra, de Zoologia Animal Comparada, Alexandre Leal Costa , Cora Pedreira e de outros mestres da Biologia .
Ensinou e dirigiu colégios em Salvador e integrou o corpo docente da Faculdade de Formação de Professores, dita Faculdade de Educação de Feira de Santana, uma das quatro escolas superiores estaduais criadas para formar professores em Vitória da Conquista, Alagoinhas e Jequié. Pelo governo Luiz Viana Filho, na gestão do secretario Luiz Navarro de Brito. Com essas quatro faculdades, iniciava-se a interiorização da educação superior estadual.
Implantados os Cursos de Letras e de Estudos Sociais, restava, contudo, a instalação do Curso de Ciências, coordenado pela professora Maria Cristina Menezes, quando assumi a Secretaria de Educação e Cultura , em 1970. Mas para que funcionasse o Curso de Ciências era indispensável o Laboratório. Trabalhamos juntos, a coordenadora do curso, professora de Biologia , e o secretário de Educação , para fazer funcionar o Curso de Ciências . Autorizei à coordenadora que fosse a São Paulo adquirir o Laboratório, na Funbec, fundação vinculada à UNESCO, com a assessoria da professora Julieta Armstrog.
Marinita fez tudo da melhor maneira possível. Assim, a Faculdade de Educação de Feira de Santana recebeu o primeiro Laboratório de Ciências, moderno e completo. Diligenciamos para que o Curso de Ciências e a Faculdade contassem com os recursos exigidos para funcionar. A sua experiência no ensino das Ciências e o conhecimento especializado de Biologia asseguraram o pleno êxito do Curso.
Anos depois, quando voltei do estágio e pesquisa no Instituto Internacional de Planejamento da Educação (IIPE) , na França, Marinita me comunicou que eu tinha sido escolhido paraninfo da primeira turma do Curso de Ciências da Faculdade de Educação, sendo o orador o atual secretário de Educação da Feira, meu prezado afilhado de formatura e confrade José Raimundo Azevedo, uma das lideranças educacionais que integra este sodalício.
Confreiras e confrades,
Com Gil Mário, manifesta-se a terceira geração de uma família compromissada com o ensino. Consciente dessa bela trajetória familiar e institucional de busca da causa da educação em nossa terra, tomei a iniciativa de propor o professor Gil Mário de Oliveira Menezes para membro do nosso grêmio, levando em consideração a experiência com os problemas do ensino e os seus longos anos de magistério, combinados com a sensibilidade para as artes plásticas. Educação mais uma vez e sempre com cultura. Proposta aceita pelos confrades, elegemos Gil Mário para a cadeira de número 21.
Gil Mário principiou o magistério com a disciplina de Desenho, no Centro de Educação Técnica da Bahia (Ceteba), em 1970. Tinha 23 anos. Soma, portanto, quarenta anos de experiência docente, dos quais trinta e quatro na rede estadual do ensino médio. Não somente Gil Mário, mas também a sua prima Ludmila de Oliveira Holanda Cavalcante pertence à terceira geração dos descendestes ilustres de Áureo Filho. Ludmila com atualíssima tese de doutorado em educação , que examinei, contribuiu para a pedagogia da alternância da família-escola no semi-árido de Monte Santo.
Com a implantação dos ginásios polivalentes, Gil Mário foi selecionado para realizar a Licenciatura em Educação Física, em Recife, na Universidade Federal de Pernambuco, visto que a Bahia não possuía a época curso superior de Educação Física. A participação no Programa de Expansão e Melhoria do Ensino Médio (Premen) exigia que todos os seus docentes fossem habilitados em licenciaturas.
Além da graduação em Educação Física é também licenciado em Desenho e Artes Plásticas pela Universidade Federal da Bahia (Ufba), atendendo à sua inclinação para às artes , em especial , para a pintura . Presentemente, cursa a pós-graduação em Artes Visuais, Cultura e Criação.
Depois dos anos de experiência docente em Salvador, veio ensinar em Feira. Como diplomado em Educação Física, o seu nome constou da relação dos professores propostos para o processo de autorização de funcionamento da Uefs, pelo então Conselho Federal de Educação. Quando do exame do processo, o relator conselheiro Newton Sucupira, destacou-o por ser professor formado de Educação Física formado por uma Universidade Federal. Dessa maneira, o seu nome foi aprovado como professor titular fundador da Uefs e assim começou o magistério superior, juntando os anos de experiência com o ensino médio.
Como seu avô, Áureo Filho, que tanto lutou pela Universidade, no exercício de sua reconhecida liderança, igualmente como sua progenitora, Gil Mário serve á UEFS como professor e incentivador das artes, realizando um trabalho excepcional de promoção artística da maior importância para a comunidade.
Há 34 anos que Gil Mário trabalha na Universidade , ensinando, pesquisando e promovendo-a de diversos modos, com exposições, artigos e vários estudos. A competência e a sensibilidade artística alinham-se a experiência docente para o serviço da comunidade. Múltiplas têm sido as designações e iniciativas das quais podemos destacar algumas.
Assumiu a assessoria cultural do Cuca e participou da implantação da Galeria de Arte Caetano Veloso, em Santo Amaro, transformada depois em Museu. Participou do intercâmbio entre o Museu de Arte Moderna e o Museu Regional de Arte de Feira, do qual resultou a exposição da famosa coleção dos artistas ingleses em Salvador. Assim compõe a Academia de Letras e Artes e o Instituto Histórico e Geográfico de Feira de Santana
Intensas têm sido as suas atividades como crítico de arte nos jornais NoiteDia e jornal Folha do Estado da Bahia com inúmeras realizações na área das artes plásticas , participando de exposições individuais e coletivas.
Como observei em uma de suas exposições, Gil Mário sempre foi um inclinado para as artes plásticas. Desde muito cedo que desenha e constrói com linhas e ângulos. Ao artesanato das maquetes, acrescentou a técnica do desenho e os segredos da plástica, que cada dia mais aperfeiçoa para atingir o ponto da possibilidade que emociona. Assim, experiências concretas e precoces manifestações engendraram o artista que cada vez mais se revela no traço, na forma do objeto, na figura, enfim, que sabe tão bem construir. É conhecedor das angulações suaves, bem sombreadas, matizadas e jogadas com estilo. Firmou-se como um notável figurativista.
A pintura de Gil Mário é bem característica e inconfundível com manifestações surrealistas, como notou o crítico Carlos Eduardo da Rocha. Com a temática da flora e da fauna, de aves e plantas, faz o encontro maravilhoso desses dois mundos e chega, com igual perfeição, à figura humana.
Mas o bom, o excelente mesmo de sua pintura é saber conquistar o espaço com cores harmônicas como o rosa e o verde em tons combinados, com asas e palmas que se harmonizam para formar o conjunto nuclear do seu trabalho . Asas e palmas que se espalham num espaço que ele cria e recria com uma pintura que cada vez mais se afirma pelo trabalho e pelas buscas constantes.
Meus caros senhores,
O ingresso do professor Gil Mário Menezes, na nossa Companhia, é o reconhecimento pela sua já longa experiência docente, tanto no sistema estadual do ensino como na Universidade. Principiou como professor de Desenho e de Educação Física e transcendeu o magistério com o brilho, o talento e as cores das suas obras de arte como pintor e promotor da cultura.
A Academia de Educação de Feira de Santana, confirmando o reconhecimento de valores, recebe o professor Gil Mário, herdeiro de expoentes de nossa educação e fomentador de novos cenários marcados com a centelha da criação artística.
A cidade tem se distinguido com a criação dos seus monumentos em homenagem a Georgina de Melo Erismann e ao Caminhoneiro. Gil Mário enche de novas formas e confirma de branco o vazio dos espaços urbanos.
È incrível como maneja o pincel e a sala de aula. Escreve a coluna e pinta suas plantas e seus animais. A sua escolha é uma homenagem ao seu marcante talento artístico combinado com as evidências pragmáticas do docente experiente.
Professor e pintor se complementam se harmonizam no mistério da criação, na combinação das cores e dos tons. Diria mesmo que é um privilégio poder tê-lo conosco em nossa Companhia. Venha, pois, meu caro amigo, já de muito que o esperamos e traga a sua Lígia e os seus três filhos, Alexandre, Catarina e Sunny.
Prezado acadêmico Gil Mário Menezes,
Esta é uma noite inigualável, única, singular. É o momento epitânico da chegada ao sodalício pedagógico da cidade. A Academia de Educação cultiva ao mesmo tempo o passado pelo exercício da memória e o futuro pela universalização do ensino em todos os níveis.
Como somos universitários, estrategicamente, formamos profissionais para o ensino infantil, fundamental, médio e superior, para todos os níveis e tipos de ensino formal, não-formal até mesmo para o informal a cargo da família, da profissão e da religião.
Devemos aumentar a escolaridade da faixa etária dos 17 aos 24 anos, ainda muito baixa na Bahia e no Brasil. A universalização da educação superior é uma determinação democrática deste século. Não mais a discussão se educação superior de elite ou de massa, mas educação superior para os da faixa etária correspondente
Enfim, é preciso ensinar tudo a todos, como prescreve Comenius.
Tudo o que você tem a fazer de agora em diante é acomodar-se na cadeira de número 21, patrocinada pela inteligência realizadora de Luís Viana Filho, que contribuiu enormemente para o crescimento moral e material de nossa Feira. Basta lembrar que ele decidiu criar a Uefs, confirmando antigo e acalentado desejo comunitário.
Sentando-se ao lado de colegas e professores, hoje, seus confrades, ficará mais uma vez próximo dos estímulos e dos carinhos de sua queridíssima mãe, nossa companheira Marinita.
Abracemos os dois acadêmicos, mãe e filho, na explosão da alegria, do contentamento e da convivência acadêmica.
Meu prezado Gil Mário, você ingressa, na Academia, como se fora a extensão de sua casa materna.
Seja bem vindo.
Bem haja.
Grato pela presença e mais ainda pela atenção.

Feira de Santana, 04 de agosto de 2010.